Desde sempre que comemoro o 25 de Abril, da
LIBERDADE/DEMOCRACIA, DA DIGNIDADE E DO DESENVOLVIMENTO junto do povo que sirvo,
e me reconhece como povo igual a eles. Sempre foi assim de Airão/Guimarães, a
Alegrete/ Portalegre, passando por
Pragal, Almada, Montemor-o- novo.
23 de
ABRIL
Este ano iniciei as comemorações no dia 23 de Abril, na
escola secundária de Alcácer-do-Sal, com os alunos do 12º ano, para lhes transmitir as seguintes mensagens:
1 – O transcendente valor da conquista da liberdade pelo
Movimento das Forças Armadas, (MFA) que poupou tanto sangue e mortes aos
portugueses, como os casos da Síria, Líbia e Egipto ilustram, e outros que se
podem seguir, como os casos de Angola, China etc.;
2- O grande valor para aqueles jovens e os seus pais do 25 de
Abril, se não tivesse acontecido, os pais de alguns jovens portugueses podiam
não o ser, por terem ficado na guerra, ou serem deficientes das forças Armadas.
As guerras de África poderiam demorar mais 30, 50 , 100 anos;
3 – O 25 de Abril, como um dos factos mais gloriosos da História de Portugal, com os seus heróis individuais:
tenente Assunção, capitão Salgueiro Maia, Alf Souto Maior e o cabo que não
disparou sobre o Salgueiro Maia, e o herói colectivo –os militares e o Povo;
4 –O legado que os jovens recebem e o povo Português e que
devem continuar e aprofundar:
5 – O testemunho vivo de que a maioria de nós do MFA, apesar de
todas as vicissitudes, do alto preço que
pagamos e da situação em que nos encontramos, consideramos que valeu apena, e
continua a valer a pena lutar pelos mesmos IDEAIS.
A turma captou as mensagens, para o que muito contribuiu as
intervenções criticas e complementares de alguns alunos: O Francisco, a Joana e
dois outros jovens com o nome de Miguel.
O contacto com os jovens é sempre um momento de raro
privilégio para continuar a construção de Abril.
Obrigado ao José Ramos de Grândola e ao professor Luís.
24 e 25 de ABRIL
Em 24 rumei a Assumar, antes passei por Vendas Novas, almocei no restaurante,
meu conhecido daqueles tempos, o Bela
Vista, falei com o seu dono, e soube da morte de um camarada que muito prezava
pela sua permanente boa disposição – o coronel Barata da Neves - que conheci,
quando Major. Por ele cai-me uma
lágrima.
Recordei o roteiro gastronómico: o Prego, com o seu dono
ainda vivo, era a catedral do bacalhau a gomes de sá; Bombel por causa das
febras, aqui já sabia que o dono tinha posto fim à vida; a Feiteira por causa
do coelho à caçador e ainda a tasquinha junto ao polígono de tiro, onde,
segundo o seu dono, identificado como tenente,
fui o primeiro ali a entrar, e , em 24 de Abril 74 o meu pelotão com o
aspirante Oliveira, meu adjunto, jantavam, enquanto eu trabalhava para a tomada
do quartel.
O dono da tasquinha
morreu, mas a sua mulher continua a obra, estive para ir visitá-la, mas depois
desisti. O dono do Bela Visa prometeu-me que quando por ali voltasse a passar
comeria o melhor Bacalhau de Portugal e arredores.
Ainda encontrei um camarada de armas que andou por Lumbala
Velha/Angola e tem contactado comigo pelo facebook, foi bom ver-te, e, ao vivo, desmentir aqueles que
dizem que morri. Se leres este texto fala por mim à viúva do senhor da
tasquinha do polígino, e diz-lhe que considerava muito o seu marido que tão bem
nos tratava, com os passarinhos e óptimas saladas de alface. Obrigado a ele, onde, quer que estejas. Choro a sua partida.
Em Assumar descobri a extraordinária dimensão humana,
cultural e de poeta de meu camarada do MFA,
do militar de Abril, Matos Serra
e a bondade da sua mulher.
Com este contacto
também fiquei a saber um pouco mais sobre alguns mistérios do 25 de Novembro
75, e da razão do pronunciamento dos praças e sargentos para-quedistas, bem
como dos objectivos da sua acção e de como o Copcon, vergonhosamente, os abandonou à sua sorte, ou desgraça.
Também o sindicalista presente na sessão estava em 25
de Abril num dos supermercados do Pão de Açúcar, próximo do Pragal, e logo que os trabalhadores daquele
estabelecimento souberam que estávamos no Pragal fecharam as portas, e levaram
para as nossas posições alimentos, o que, depois foi feito pela população do Pragal,
com base no restaurante, onde, mais tarde Fernando Tordo e Luísa Bastos muitas
vezes cantaram ao vivo, e com raro prazer os ouvi.
Também no Pragal voltei a comemorar o 25 de abril com o Chico
Patrício (delegado do sindicato dos mineiros de Aljustrel nos anos do PREC, um
grande amigo que já partiu, mas a sua filha,
Carla Patrícia, é minha amiga virtual no facebook) e outros amigos de
Almada.
O Pragal, aonde,
chegamos na manhã do 25 de Abril 74, com o fogo que queimaria a ditadura, para
fazer nascer a Liberdade, é um lugar
memorável e as suas gentes verdadeiros MFA.
Seguindo o roteiro deste
ano, no dia 25 de Abril estivemos em Alegrete. Transmitimos as mesmas
mensagens, e por todos fomos muito bem acolhidos: pelo presidente da junta e pelo grupo coral,
dirigido por um nosso camarada de armas, o sargento-mor Frazão.
Aqui também
reencontrei um militar das bandas que no dia 4 de Dezembro de 1973, esteve na
Escola Prática de Artilharia, no dia de Santa Bárbara e da Artilharia, contou
ele, que naquele dia sentiu grande tensão no ar e nos discursos, e não era razão
para menos, pois na Escola tínhamos posto a hipótese de prender todos o dignitários
militares presentes, entre eles o Ministro do Exército, que teve a sua sina de fim
de mandato muito relacionada com a Escola Prática de Artilharia, pois no dia 25
de Abril 74 iria visitar a mesma Escola,
mas já não saiu de Lisboa.
Nesta sessão alguns jovens marcaram presença e no fim da
mesma, para minha grande alegria vieram
dar-me conta de quanto a nossa mensagem e o modo expressivo como lhes falei tinha tocado fundo nas suas
Almas.
28 de ABRIL
Em 28 de Abril estive em Montargil com os resistentes, com os
que ainda têm uma cooperativa agrícola de pé – a Nova Força – Uma cooperativa
de mulheres que nunca desistiram.
Nesta terra muitos sabem o que foi a Reforma agrária, muitos
sabem que aquelas terras até Coruche sendo de regadio, e havendo muita água
podiam dar pão e emprego que não dão,
porque os tiros, os cães e as bastonadas da GNR, por força da lei antipatriótica
de António Barreto terminaram uma grande experiência de produção agrícola, e levou, de novo, ao abandono das terras e à criação de Hotéis
de 5 estrelas que só podiam falir, como aconteceu, sem nenhuma mais valia para
o povo.
Nesta terra, Montargil,
o coração mais empedernido e diabólico
chora com a dor destas pessoas que para serem tratadas das suas doenças: ora têm
de se deslocar ao hospital de
Portalegre; ora a Abrantes, de acordo com as especialidades.
Todavia, não vi em ninguém, desta gente tão sofrida, desamimo,
mesmo nos que padecem de cancro e têm de se deslocar a Lisboa, em seguimento do
tratamento, de 3 em 3 meses.
Gente heroica que não morreu sob as balas da GNR, para o que
tiveram de se atirar para valas de água, e ficarem só com a cabeça de fora,
para respirarem, também não morrerão sob a pata das medidas para vencer esta
crise. Medidas socialmente injustas e brutais, porque atingem com mais
violência e virulência alguns, deixando de fora muitos políticos e outros que,
por exemplo, beneficiaram da monstruosa fraude
do Banco Português de Negócios (BPN) que nos leva até ao último cêntimo, sem
que os responsáveis sejam julgados e os seus bens arrolados, e a este
julgamento não deviam escapar quem nacionalizou, de um modo odioso e
comprometido, toda a toxidade deste
banco.
Todavia um grito de
grande revolta é preciso dar e fazer ecoar
- CONTRA O DESRESPEITO POR ESTE
POVO E PELO PATRIMÓNIO HISTÓRICO E CULTURAL DE MONTARGIL. A SUA CASA DO POVO,
BELO E BONITO EQUIPAMENTO DEIXADO PELO REGIME ANTERIOR, COM A SUA ARQUICTETURA CARACTERISTICA
E MUITO BEM INSERIDA NO ESPAÇO RURAL, ESTÁ NUMA FASE INACEITÁVEL DE DEGRADAÇÃO.
Gritei e grito junto de todos, e vos digo lutem, exigem o vosso centro de
saúde , cujas obras começaram e estão interrompidas há um ano e têm de recomeçar, e também a vossa casa do povo tem de ser restaurada, tem todos os vidros partidos que foram
substituídos por tábuas, dando a tão bela joia o aspecto MISERÁVEL DE PARDIEIRO
– INACEITÁVEL, INTOLERÁVEL . LUTEM TODOS OS DIAS PARA POREM COBRO a TAMANHA BABARIDADE.
A todo o povo de Montargil o meu abraço, e obrigado, em especial ao José Lopes.
Assim aconteceu, e se fez o meu 25 de Abril de sempre.
Já agora se,
entretanto, morrer que se juntem: a minha família e os meus amigos, num quintal
qualquer e cantem Abril, bebam um bom tinto e comam umas febras, se possível no Pragal
junto ao Cristo Rei, na casa onde com o Chico Patrício comemorei Abril .
Seria um óptimo sítio, mas se nada fizerem não me zango, até
porque a festa é sempre para os viventes, e, eu nem em vida me aborreci com os
que nunca deram pela minha existência que, aliás, é igual ao de 99,99% dos portugueses, ou seja
com pouco, ou nenhum significado para os outros. Só me dou a esta coisa, de
bastante trabalho, de escrever estas e outras coisas vãs… coisas…
Gente sofrida, gente humilde, gente amiga, gente de Abril,
entre vocês sinto-me em casa, na minha casa de hoje, como na da minha mãe e
irmãs.
Abraço-vos.
andrade da silva
Foto: flores selvagens de Alcácer.